Há poucos dias, vimos pelo menos duas grandes revendas de insumos agrícolas entrando em recuperação judicial (RJ). Além de gerar grande instabilidade no mercado, isso pode trazer diversos problemas futuros para o produtor rural que com elas mantinha relacionamento comercial. Especialmente quando foram firmados contratos de entrega futura de produtos agrícolas e contratos futuros de fixação de preço, ou mesmo quando há grãos do produtor depositados junto à empresa.
A insegurança gerada por esse cenário é enorme, por isso a busca por orientação jurídica especializada é essencial para o produtor rural minimizar seus riscos e proteger o seu patrimônio de surpresas desagradáveis. Entenda o porquê no artigo abaixo.
O risco dos contratos de barter
Um dos principais desafios ocorre quando o produtor firmou contratos de entrega futura de produtos agrícolas, geralmente em operações de barter (troca). Nessas situações, o produtor assume a obrigação de entregar uma quantidade de grãos em troca de insumos que serão recebidos no momento da semeadura ou evolução da lavoura (entenda mais sobre a operação de Barter clicando aqui).
Se a revenda entra em recuperação judicial e o produtor ainda não retirou todos os insumos, o cumprimento da entrega de insumos se torna incerto, com um agravante: os títulos (CPRs, por exemplo) podem ter sido endossados (repassados) para terceiros, o que amplia o risco de cobrança.
Exemplo prático: imagine um produtor que firmou contrato de troca para entregar 6.000 sacas de soja quando da colheita da safra. Porém, logo após o contrato, a revenda entrou em recuperação judicial e fechou as portas, sem entregar os insumos acordados. O complicador é que, antes da RJ, o título foi endossado (isto é, transferido) a um credor da revenda, que, no seu vencimento, cobrará judicialmente do produtor a entrega das 6.000 sacas de soja.
Apesar do exemplo causar calafrios, este foi um caso real que já acompanhamos no escritório, onde o produtor, mesmo sem ter retirado os insumos ou recebido pela soja, se viu obrigado por uma ordem judicial a cumprir uma obrigação de entrega de grãos com um terceiro que desconhecia.
Contratos de fixação de preço e entrega futura de grãos
O mesmo ocorre com contratos de fixação de preço. Em grande parte dos casos, o pagamento dos grãos ocorre somente após a entrega do produto agrícola, o que gera a incerteza para o produtor se deverá ou não cumprir com a sua obrigação, correndo o risco de não receber o valor da venda ou de ter que arcar com os encargos moratórios do descumprimento contratual (que o passado recente já demonstrou ser pesado).
Grãos depositados e a incerteza do pagamento
Outro problema recorrente é o dos produtores que tinham grãos depositados junto à revenda que entrou em recuperação judicial. É muito comum que, quando a empresa entra em recuperação judicial, o produto depositado já não exista mais. Assim, o produtor sequer tem a possibilidade de tentar buscar novamente os bens depositados. Pelo próprio procedimento da recuperação judicial, ele passa a ser apenas um credor da empresa, ficando sujeito ao plano de recuperação que será discutido em assembleia.
Nestes casos, o pagamento desses grãos se torna incerto e o produtor, que já contava com essa mercadoria ou seu valor, se vê em uma situação de grande vulnerabilidade.
A experiência já nos mostrou exemplos onde o produto depositado, na aprovação do plano de recuperação, foi “cortado pela metade”, isto é, se o produtor tinha 10.000 sacas depositadas, o plano foi aprovado para a empresa pagar apenas 5.000 sacas – e ainda com longo prazo e sem juros.
Como agir nessas situações?
Diante desses cenários, é crucial que o produtor rural tome medidas rápidas e assertivas para proteger seu patrimônio:
- Revisar contratos e títulos endossados: uma análise pormenorizada dos contratos e títulos de crédito é essencial, pois a saída pode estar “em uma vírgula”.
- Analisar sua posição na recuperação judicial: se o produtor se tornou um credor, é importante buscar a orientação de um advogado especializado para entender sua posição na recuperação judicial e os riscos envolvidos e, se for o caso, fazer a impugnação de seu crédito no processo judicial. A participação ativa na assembleia de credores também é fundamental para tentar garantir o melhor desfecho possível.
- Negociar com a própria revenda: mesmo em recuperação judicial, há margem para negociação, sendo possível renegociar obrigações e ajustar os termos de pagamento. Lembrando que uma assessoria jurídica experiente pode ajudar o produtor a alcançar melhores resultados nessas negociações.
- Se proteger de outros credores: alguns dos riscos colaterais dos exemplos citados são a perda de faturamento do produtor e o agravamento dos custos de produção, o que pode levar à dificuldade de pagamento de obrigações com terceiros, como um financiamento rural. Neste caso, o produtor deve trabalhar com estratégias focadas na defesa do seu patrimônio, buscando minimizar os impactos de inadimplências futuras.
Conclusão
A recuperação judicial de uma revenda pode impactar de maneira significativa o produtor rural, seja pelos contratos de entrega futura, fixação de preço, ou recebimento dos grãos depositados. Nessas situações, é vital contar com uma assessoria jurídica especializada para revisar contratos, negociar e participar das assembleias de recuperação e, mais do que isso, buscar as melhores soluções possíveis a para defesa de patrimônio diante dos riscos e incertezas causados pela recuperação judicial.
Se você está enfrentando uma situação semelhante, procure um advogado especializado que poderá propor soluções jurídicas personalizadas para cada situação e, assim, minimizar os prejuízos decorrentes da recuperação judicial de revendas.
Tobias Marini de Salles Luz – advogado na Lutero Pereira & Bornelli – advogados. Contato: (44) 9 9158-2437 (whatsapp) / tobias@direitorural.com.br / www.pbadv.com.br
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