A MP 896/2019, adjetivada de MP do Agro, fez supor que toda sua disciplina, assim que transformada em Lei, teria como objetivo voltar-se exclusivamente ao agronegócio, notadamente ao produtor rural.
Ao ser convertida na Lei nº 13.986/2020 (Lei do Agro), o que ficou patente é que um dos seus institutos inovadores, a saber, o patrimônio de afetação, bem assim o título de crédito que instituiu, qual seja, a Cédula Imobiliária Rural, não estavam reservados ao produtor rural.
Patrimônio de afetação
No caso do patrimônio de afetação, não obstante passível de incidir somente sobre imóvel rural, sua constituição não é obra do produtor rural, mas sim, do proprietário rural, seja ele produtor rural ou não.
Afinal, a Lei dispõe em seu Art. 7º que a submissão do imóvel rural ao patrimônio de afetação está na esfera de competência do seu proprietário, sem exigir que o mesmo seja produtor rural.
Produtor rural, como se sabe, é quem produz produto rural e não aquele que é proprietário de imóvel rural.
É fato que ser proprietário rural e produtor rural podem se confundir numa única e mesma pessoa, mas não necessariamente. Afinal, é possível ser produtor rural sem ser proprietário de imóvel rural ou vice-versa, é possível ser proprietário rural sem ser produtor rural.
Portanto, quando se tratar de imóvel de afetação em imóvel rural o correto é dizer que se trata de instituto voltado ao interesse do proprietário rural e não necessariamente do produtor rural.
Cédula Imobiliária Rural na Lei do Agro
O mesmo entendimento se aplica à Cédula Imobiliária Rural que, tendo sido instituída para ter como garantia imóvel rural submetido ao regime de afetação, pode ser emitida pelo proprietário rural (Art. 18).
Como a Lei não exige que o proprietário rural emitente da CIR seja também produtor rural, isso quer dizer que o ser proprietário rural é condição para firmação da Cédula, mas não o ser produtor rural.
Portanto, diante da disciplina da Lei do Agro, é possível deduzir que não se trata de privilégio exclusivo do produtor rural a constituição do patrimônio de afetação em imóvel, menos ainda a emissão da Cédula Imobiliária Rural, embora por ele possa ser utilizada.
Vale dizer mais, ou seja, que tanto o patrimônio de afetação, como a Cédula Imobiliária Rural, ambos poderão ser empregados em operações de crédito para além daquelas que são próprias do agronegócio.
Deste modo, o correto é referir-se ao patrimônio de afetação em imóvel rural e a emissão da Cédula Imobiliária Rural como do interesse do proprietário rural, o que deixa evidente que, nestas partes, a Lei do Agro foi para além do agro.
Lutero de Paiva Pereira – Advogado especializado em direito do agronegócio em Maringá (PR). Contato: www.pbadv.com.br / pb@pbadv.com.br
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