Da leitura singela, e até mesmo distraída, do art. 1º, da Lei 8929/94, diploma legal que instituiu a Cédula de Produto Rural (CPR), se depreende que ao subscrever o título o devedor assume a promessa de entregar produto rural ao credor. Para dar solidez jurídica à cártula, a Lei especial estabeleceu no art. 3º os requisitos essenciais do título. Já escrevemos sobre tal dispositivo: “De todos os oito requisitos enumerados por este artigo como essenciais à Cártula, sete deles devem ser considerados como relevantes e imprescindíveis à sua perfeita caracterização, sem os quais o título perde sua força executiva. A exceção fica por conta do requisito constante do inc. VI, já que a cédula, a teor do contido no art. 1º, poderá ser firmada com ou sem garantia cedularmente constituída.” (COMENTÁRIOS À LEI DA CÉDULA DE PRODUTO RURAL (CPR) – Editora Juruá – 5ª ed. p. 35). Para tratar de um determinado aspecto da defesa que o devedor de CPR pode manejar em face da cobrança proposta pelo credor, são separados somente os incisos II, IV e V, do mencionado art. 3º.
Pelos referidos incisos fica patente que a Cédula deverá conter, respectivamente, a data de entrega do produto, sua qualidade e quantidade, bem assim o local e condições de entrega.
A partir do momento que a Cédula é emitida, a promessa assumida pelo devedor dá ao credor o direito de exigir que o produto rural seja entregue não só em determinada data, como também em local estabelecido no título, sob as condições pactuadas (ensacado, à granel, enfardado, etc.), respeitando ainda a qualidade e a quantidade convencionadas.
Ocorre que, não poucas vezes, ao propor a cobrança da CPR, o que se dá pelo rito da entrega de coisa incerta, conforme está previsto no art. 15, da Lei 8.929/94, o pedido manifestado em juízo pelo credor se mostra contrário ao convencionado da cártula, o que lhe retira o direito ao sucesso da demanda.
Tal se verifica, por exemplo, quando a cobrança do título é proposta em local diferente daquele de entrega da coisa (conforme previsto em cláusula específica) e o exequente pleiteia ao juízo que a entrega do produto rural se dê na comarca da execução, ou ainda, quando a despeito da execução ter sido proposta na comarca de entrega da coisa, o pleito do autor é que a entrega do produto rural ocorra em local diverso daquele que na cédula foi convencionado.
Ora, num e noutro caso o pedido não tem proteção jurisdicional, pois o só fato da verificação do inadimplemento da cédula não é suficiente para derrogar as estipulações nele acordadas, de modo que a despeito de não ter cumprido com a promessa na data aprazada, o devedor somente poderá ser compelido a tanto em termos de quantidade, qualidade, local de entrega e condições de entrega, nos termos previstos na Cédula.
Se, por um lado, o devedor não está obrigado a fazer o que o título não o obriga, por outro o credor não tem o direito de pleitear diferentemente do que o título autoriza. Sendo assim, se o pedido de entrega contraria a convenção por apontar local diverso daquele que inicialmente foi convencionado ou, ainda, em condições, em quantidade e em qualidade contrários à promessa, a pretensão não pode ser acolhida.
Sendo este o caso poderá o devedor, até mesmo em exceção de pré-executividade, se houver tempo, defender-se da coação indevida que está na iminência de sofrer.
Lutero de Paiva Pereira – Advogado especializado em direito do agronegócio. Fundador da banca na Lutero Pereira & Bornelli – advogados. Contato: (44) 99158-2437 (whatsapp) / pb@pbadv.com.br / www.pbadv.com.br
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