Quando o produtor rural contrata operação de financiamento com uma instituição financeira oficial, ou mesmo com instituição financeira não oficial, mas autorizada a repassar os recursos, é muito importante que esteja atento à fiscalização que o agente financeiro faz para comprovar a aplicação do crédito rural.
Afinal, se o fiscal atestar que houve desvio dos recursos para fins diversos do que determina a lei ou o contrato, a conduta poderá ensejar sanção na esfera civil com repercussão, inclusive, na área penal.
No âmbito civil, o desvio parcial ou total do crédito pode levar à desclassificação da operação para enquadrá-la na modalidade crédito comum, quando o financiamento passa a sofrer a incidência de taxas de juros e multas em índices mais elevados do que aqueles inicialmente programados no contrato.
No campo penal, o desvio do crédito poderá levar o enquadramento do produtor rural na conduta delitiva tipificada pelo art. 20 da Lei 7.492/1986, que trata dos crimes contra o sistema financeiro, mais conhecida como Lei do colarinho branco.
No referido artigo, está prevista a pena de reclusão de dois a seis anos e multa (art. 20) para quem aplica, em finalidade diversa da prevista em lei ou contrato, recursos provenientes de financiamento concedido por instituição financeira oficial, como o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), Banco da Amazônia (BASA), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDS) ou por instituição credenciada para repassá-lo.
É da competência do Ministério Público Federal, conforme sobressai do seu art. 26, propor ação penal alusiva ao crime que tramitará perante a Justiça Federal.
Considerando, pois, as consequências cíveis e penais que decorrem do desvio dos recursos do financiamento, é mister que o financiador, como responsável direto pela fiscalização e comprovação de aplicação do crédito, tome algumas precauções para efetivação do ato.
Primeiramente, que indique, para realização da fiscalização, profissional que tenha qualificação e esteja legalmente habilitado para realizá-la. Em segundo lugar, que alerte o fiscal de que a fiscalização deve levar em conta o cronograma de aplicação do crédito, o qual deve constar de cláusula específica do título ou em documento apartado. Em terceiro lugar, que dê oportunidade ao financiado para apresentar razões contrárias ao laudo e, se o caso, até mesmo a realização de uma nova comprovação.
Somente depois de observado estes três passos e persistindo a higidez do laudo, é que o fato deverá ser levado ao conhecimento do Ministério Público Federal para as providências pertinentes.
Como o Banco Central do Brasil tem competência para fiscalizar as operações bancárias, se verificar que o desvio foi comprovado e que a instituição financeira não deu encaminhamento da documentação para oferecimento de denúncia, com base no art. 28 da mesma Lei, poderá informar ao Ministério Público Federal, enviando-lhe os documentos, para instauração da ação penal.
Portanto, como a questão é bastante séria, não é prudente que o produtor rural fique alheio ou indiferente ao procedimento fiscalizatório do agente financeiro, menos ainda que assine o laudo que lhe é apresentado pelo fiscal sem antes medir o grau de comprometimento do seu direito.
Logicamente que a instituição financeira poderá ser responsabilizada e responder pela reparação do dano causado ao produtor rural caso a fiscalização tenha se dado de forma contrária às normas que regem o crédito rural, quando for o caso.
Por derradeiro, vale ressaltar que o desvio de crédito caracterizador do crime previsto no art. 20 da Lei 7.492/1986 pode acontecer com qualquer tipo de financiamento, independentemente de os recursos serem originários ou não de crédito rural.
Lutero de Paiva Pereira – Advogado especializado em direito do agronegócio em Maringá (PR). Contato: www.pbadv.com.br / [email protected]
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