A contratação de um seguro agrícola normalmente está atrelada ao calendário do ZARC – Zoneamento de Risco Climático, editado pelo MAPA em parceria com a Embrapa. Este calendário, que já virou uma espécie de “manual de plantio”, contém referenciais de datas indicadas de semeadura de determinadas cultura separados por cidade e tipo de solo, além da indicação das sementes autorizadas para plantio e indicação de janelas de riscos.
Uma das finalidades do ZARC é justamente servir de referencial para a contratação de seguro rural. E é aqui que começam os problemas.
Uso do ZARC pelas seguradoras
Visando ter um parâmetro de datas de risco, as Seguradoras utilizam o calendário do ZARC como regra a ser seguida pelo produtor segurado. Aliás, invariavelmente, uma das perguntas feitas nos questionários de risco é justamente se o produtor irá seguir o calendário de ZARC em sua lavoura, onde a resposta sempre deve ser positiva. Plantios feito em desacordo com o ZARC são sumariamente excluídos das apólices, não gerando direito à indenização.
O fato que merece atenção, todavia, é quando o calendário do ZARC não pode ser cumprido por questões eminentemente naturais, como o excesso de chuvas no momento do plantio, situação que pode levar o produtor a ter que alterar a data inicialmente prevista.
O exemplo é muito simples e ocorre com frequência. Por exemplo, esta situação ocorreu na safra de inverno do milho/2021 e, novamente, vêm ocorrendo nesta safra de 2023 em algumas regiões do Paraná. Em determinadas localizações, a constância de chuvas é tamanha que os produtores estão impedidos de fazer a colheita da soja e o plantio do milho dentro da janela indicativa do ZARC. E isto por um motivo simples: com chuva e terra molhada, as máquinas não podem entrar na terra.
Dessa forma fica a dúvida: seguir impreterivelmente o calendário ZARC, sabendo que isso não será agronomicamente viável, vez que não se planta com chuva, ou aguardar a condição climática ideal e plantar no momento certo, alguns dias após a chuva, mesmo que isso implique sair da janela do ZARC?
ZARC: orientativo ou compulsório?
Por óbvio que, pensando nas melhores técnicas agronômicas e visando reduzir riscos, o correto é o produtor plantar no momento climático correto, não conforme um calendário burocrático fixado meses ou anos antes do plantio, quando ainda não se tinha a correta previsão do clima. Por isso que defender a observância compulsória do calendário do ZARC, como defendem as seguradoras, não é, a nosso ver, o melhor entendimento jurídico a ser seguido. Entendemos que o calendário do ZARC, justamente por ser um calendário feito para “reger a natureza”, deve ser compreendido como um instrumento orientativo para produtores e seguradoras, isto é, de observância necessária, porém admitindo exceções quando as condições climáticas assim exigirem, ou quando isso significar melhor prática agronômica a ser seguida para redução do risco da lavoura.
Tomemos como exemplo um produtor que finaliza o plantio de parte de sua lavoura de milho 3 dias após o fechamento do calendário do ZARC. Assim, ele tem, na mesma área, um talhão plantado dentro e um talhão plantado fora do ZARC. Vem a seca, a seguradora é chamada, e o talhão plantado fora é descontado. Todavia, na amostragem e mensuração das perdas, observa-se que ambos os talhões tiveram exatamente a mesma produtividade. Logicamente, conclui-se que não foi o plantio fora do ZARC a causa das perdas, por isso entendemos que a indenização permanece devida.
Outro exemplo: o produtor planta 6 dias após o fechamento do calendário do ZARC, em razão das chuvas que impediram as máquinas de entrar na área. A lavoura se desenvolve bem, já entra em estágio reprodutivo avançado, porém sofre com uma severa geada que queima toda a lavoura. A geada é um evento que não tem a ver com o estágio da planta, tampouco com o solo, pois ela pega a parte aérea da planta. Todavia, seguradora nega indenização por plantio fora do ZARC. Mais um exemplo de interpretação que entendemos abusivo, pois a geada atingiria a lavoura independente da data de seu plantio.
Conclusão
Dessa forma, entendemos que o produtor deve, sempre que possível, seguir a recomendação do calendário ZARC.
Todavia, se isso não for possível, entendemos que o seguro não pode ser sumariamente excluído somente por este fato. Provado que as perdas não tiveram relação direta com a data do plantio (observância do calendário), a apólice deverá subsistir em sua integralidade.
Neste caso, recomendamos que o produtor se cerque de alguns cuidados simples quando observar que não conseguirá plantar dentro do ZARC, como notificar a seguradora, fazer provas fotográficas ou laudos agronômicos, sempre sob observância de um advogado especialista no assunto.
Tobias Marini de Salles Luz – advogado na Lutero Pereira & Bornelli – advogados. Contato: (44) 9 9158-2437 (whatsapp) / tobias@direitorural.com.br / www.pbadv.com.br
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