Em ação patrocinada pelo escritório Luz, Castro & Bornelli Advogados, a Justiça paraense proferiu duas decisões importantes — uma em 1º grau e outra no Tribunal — reconhecendo o direito do produtor rural ao alongamento da dívida rural em razão de severas perdas climáticas e econômicas. As decisões impediram o Banco CNH de apreender o maquinário financiado, negativar o produtor e prosseguir com quaisquer atos de cobrança.
O caso: estiagem, excesso de chuvas e desequilíbrio financeiro
O produtor contratou crédito rural perante o Banco CNH para financiar a aquisição de maquinário agrícola. Todavia, fatores adversos prejudicaram a atividade agrícola e dizimaram sua rentabilidade, ocasionando graves prejuízos.
No caso, houve forte estiagem na safra 2023/2024, seguida de excesso de chuvas na colheita de 2024/2025 — fatos amplamente reconhecidos por decretos estaduais de emergência e pela Portaria MIDR nº 1.337/2025. Além disso, houve aumento expressivo dos custos de produção e queda acentuada nos preços de comercialização, fatores que comprometeram diretamente a capacidade de pagamento do produtor.
Mesmo assim, o banco recusou o pedido de alongamento, insistindo em soluções inviáveis, como liquidação imediata e renegociação com juros excessivos.
A decisão de 1º grau: proteção imediata da atividade agrícola
Devido à recusa em prorrogar a operação, o Autor ajuizou ação de alongamento. O juiz deferiu a tutela de urgência pleiteada, reconhecendo a natureza rural das operações, as provas apresentadas e o direito do produtor. Por conta disso, determinou:
- suspensão da exigibilidade de cinco CCBs vinculadas ao financiamento de máquinas;
- proibição de qualquer ato executivo, inclusive busca e apreensão;
- vedação à negativação do produtor;
- multa de R$ 2.000,00 por descumprimento.
O magistrado enfatizou que o maquinário é essencial para a continuidade da atividade agrícola, e sua retirada levaria ao colapso econômico do produtor — exatamente o risco que a política de crédito rural busca evitar.
Além disso, reconheceu expressamente que o alongamento é direito subjetivo do mutuário (Súmula 298/STJ), desde que comprovadas as hipóteses do MCR 2.6.4, todas presentes no caso.
A tentativa do banco no Tribunal e a resposta do TJPA
Inconformado, o banco recorreu pedindo que o tribunal cassasse a decisão. Entretanto, o Tribunal rejeitou os argumentos e manteve a decisão.
A relatora destacou que o produtor apresentou pedido de alongamento antes do vencimento; o laudo técnico comprovou incapacidade de pagamento; e as CCBs foram claramente enquadradas como operações de crédito rural no programa BNDES – Crédito Rural TFB.
O TJPA reforçou que o MCR 2.6.4 não prevê prazo rígido para requerer a prorrogação e que a instituição financeira não pode criar exigências não previstas na norma.
Também reiterou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, considerando a hipossuficiência técnica e financeira do produtor frente ao banco, justificando a inversão do ônus da prova.
Por que essa decisão importa
O conjunto das decisões traz duas mensagens fundamentais para o produtor rural:
O crédito rural por finalidade prevalece sobre o rótulo do contrato. Mesmo que emitido como CCB, se os recursos financiaram a atividade agrícola, aplica-se o regime jurídico especial do crédito rural.
O alongamento é direito subjetivo, não favor do banco. É necessário, contudo, comprovar frustração de safra, dificuldade de comercialização ou fatores adversos que comprometam a renda.
Conclusão
O caso reafirma a função social do crédito rural e o direito ao alongamento compulsório quando preenchidos os requisitos legais. Em tempos de instabilidade climática e econômica, decisões assim garantem não apenas a sobrevivência do produtor, mas a continuidade da produção agrícola no país.
Julio César Nascimento Bornelli – advogado, sócio-fundador da banca LCB Advogados. Contato:
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