Se a MP 897/2019 foi chamada de MP do Agro e se transformou na Lei 13.986/2020, então esta Lei poderia ser chamada de Lei do Agro? Talvez. E se for, é preciso ficar atento ao fato de que ser “Lei do Agro” é uma coisa, ao passo que ser “Lei para o Agro” é outra bem diferente. Parece que ela se encaixa mais no primeiro do que no segundo caso.
Quem já ouviu o ditado de que nem tudo que reluz é ouro, e entendeu sua mensagem, faz bem em aplicá-lo daqui por diante nas suas tratativas comerciais, pois é possível que muitas propostas reluzentes nada tenham de ouro.
Vamos tratar, inicialmente, de apenas seis cuidados a serem tomados pelo produtor rural daqui pra frente.
1º Cuidado – Patrimônio de afetação em CPR
Na emissão de CPR é preciso redobrar a atenção. É que a Lei 13.986/2020 (Art. 1º § único) agora autoriza que a CPR seja garantida também por patrimônio de afetação. Se o nome da nova garantia é terrível para o produtor entender, pior ainda suas consequências jurídicas. Basta dizer que o patrimônio de afetação é algo pior do que a alienação fiduciária de bem imóvel, que por si só é terrível.
Portanto, quando for negociar uma possível emissão de CPR nestes termos, o emitente deverá verificar se o credor não está exigindo esta nova garantia. Se estiver, o melhor a fazer é consultar imediatamente seu advogado para saber sobre as consequências jurídicas a atingir o imóvel.
2º Cuidado – Cédula Imobiliária Rural
A Lei 13.986/2020 criou um novo título de crédito para uso das instituições financeiras, a saber, a Cédula Imobiliária Rural – CIR. Como a CIR poderá ser emitida para contratar operação de crédito de qualquer modalidade (Art. 17, I), é bem provável que, doravante, os bancos venham a fazer uso frequente desta Cédula, até mesmo para contratar financiamento rural, afastando-se da Cédula de Crédito Rural.
Acontece que, pela CIR, o produtor rural dá em garantia da operação imóvel sobre o qual foi instituído o tal patrimônio de afetação. É preciso ter cuidado com esta garantia, pois se a cédula não for liquidada no vencimento, o credor pode passar imediatamente para seu nome a propriedade dada em garantia.
Portanto, antes mesmo de assinar uma Cédula Imobiliária Rural, informe-se com seu advogado sobre os riscos do negócio.
3º Cuidado – CPR-f em dólar e juros flutuantes
A partir de agora, a CPR financeira poderá ser emitida com taxa de juros, fixa ou flutuante, até mesmo com variação cambial, o que vai elevar sobremodo o valor a ser pago pelo emitente. E o pior. Se a CPR-F tiver taxa de juros flutuante e variação cambial, o devedor nem saberá ao certo o valor da dívida a ser pago.
Portanto, é preciso ter cuidado daqui para frente ao emitir uma CPR Financeira, porque o nome da Cédula não mudou, mas a forma de obter o valor do débito mudou totalmente e para pior.
4º Cuidado – Estelionato em contrato de CPR
Quando o produtor rural emitia uma Cédula de Produto Rural – CPR, uma coisa que nunca entrou na sua zona de preocupação foi ler as cláusulas postas pelo credor no seu contexto. Sua confiança era tanta, que tudo que achava que deveria fazer era assinar o título e depois pagar.
Daqui pra frente terá que ter mais cuidado. Deverá ler ou pedir que seu advogado leia a Cédula para saber se tudo está realmente em ordem, pra não correr o risco de cometer um crime. Afinal, pela Lei 13.986/2020 ficou caracterizado como estelionato fazer declarações falsas ou inexatas acerca de sua natureza jurídica ou qualificação, bem como dos bens oferecidos em garantia da CPR, inclusive omitir declaração de já estarem eles sujeitos a outros ônus ou responsabilidade de qualquer espécie, até mesmo de natureza fiscal.
Portanto, até mesmo a declaração inexata dos bens oferecidos em garantia (penhor, hipoteca, etc), pode complicar a vida do produtor rural.
5º Cuidado – Fundo Garantidor Solidário
Daqui para frente, as operações de crédito realizadas por produtores rurais, incluídas as resultantes de consolidação de dívidas, poderão ser garantidas por Fundos Garantidores Solidários, os quais também poderão se fazer presentes no financiamento para implantação e operação de infraestruturas de conectividade rural.
Os Fundos serão compostos, dentre outros, por, no mínimo, dois devedores, que deverão integralizar cotas no percentual de 4% sobre o saldo devedor das operações a serem garantidas. Os Fundos terão estatuto próprio, que o devedor deverá conhecer para saber como funcionam.
Portanto, será preciso tomar cuidado na hora de contratar uma operação de crédito com FGS, pois, na ignorância, seu direito poderá ficar prejudicado.
6º Cuidado – Patrimônio de afetação
Se o proprietário de imóvel rural quer constituir o famoso patrimônio de afetação, que significa, de modo bastante simplificado, separar uma parte do seu patrimônio para, mais tarde, figurar como garantia numa Cédula Imobiliária Rural, ou mesmo numa Cédula de Produto Rural, antes mesmo de começar o processo junto ao registro de imóveis, será preciso tomar o cuidado de consultar um advogado sobre seus efeitos jurídicos.
Afinal, aquela ideia de que seria ótimo para o produtor rural ter a opção de não hipotecar toda a fazenda, mas somente parte dela em favor do credor, não é bem assim.
Lei do Agro – conclusão
É possível dizer que a Lei 13.986/2020 traz tanta inovação no campo das relações jurídicas, que, daqui pra frente, o produtor rural deverá ser capacitado não só para produzir, como também para contratar e, neste último caso, sob assessoria de um bom advogado.
Por sua complexidade, o agro não admite nem produtores, nem advogados amadores.
Lutero de Paiva Pereira – Advogado especializado em direito do agronegócio. Fundador da banca na Lutero Pereira & Bornelli – advogados. Contato: (44) 99158-2437 (whatsapp) / pb@pbadv.com.br / www.pbadv.com.br
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