Mesmo que de início a ideia do direito de pagar menos possa parecer um pouco estranha, juridicamente é sustentável propor que o devedor poderá livrar-se de uma dívida por valor inferior ao seu saldo devedor em se tratando de um financiamento rural em que o mesmo foi cedido pelo banco a um novo credor sem as cautelas recomendadas. Esse direito decorre do fato do crédito rural seguir regras especiais voltadas à proteção da atividade agropecuária e aquele que a empreende, tendo em conta sua importância econômico-social para o país.
Se a produção de alimentos é importante para, dentre outras coisas, garantir a ordem pública e a paz social através de um abastecimento alimentar adequado, parece mais que justo o produtor rural merecer proteção legal para desenvolver sua atividade, pois sem que ela tenha sucesso permanente o risco de uma instabilidade econômica e social é imediato.
Quando se observam os objetivos que direcionaram a institucionalização do crédito rural no País, os quais podem ser vistos nas leis que regulamentam a matéria, com facilidade se nota que o crédito faz jus a um tratamento em muito superior àquele dispensado aos contratos bancários comuns, e isto porque seu fim maior é o bem-estar do povo.
E já que o produtor rural desenvolve uma atividade que traz grandes benefícios sociais, o legislador entendeu por bem em criar uma linha de financiamento que tivesse não só a característica de fomentar e impulsionar a agricultura, como também de fortalecer economicamente o seu tomador para lhe dar condições de investir melhor na exploração. Por isto é que quando o agente financeiro contrata uma operação de financiamento rural, ele bem o sabe que aquele crédito segue regras especiais que não podem ser descumpridas.
Nesse sentido é acertado dizer que se o banco que concedeu o financiamento deseja depois de contratada a operação vender seu crédito para quem quer que seja, não poderá fazê-lo com a mesma liberdade aplicada nos contratos de crédito comercial e industrial, sob o risco de fazer um negócio mal feito.
Assim, para que o banco não corra risco na hora de vender ou ceder seu crédito, e para que o comprador ou cessionário não adquira de maneira a ver sua compra ser desfeita, o devedor rural deve ser informado da transação, para ter oportunidade de pagar a dívida pelo mesmo valor que cessionária pagaria ao cedente.
Ultimamente tem sido comum o devedor de crédito rural ser surpreendido por uma execução judicial, quando o credor primitivo já não mais faz parte da relação jurídica, visto ter cedido seu crédito ao exequente. Ao examinar o processo o devedor fica sabendo que a dívida foi cedida pelo banco ao novo credor por valores muito pequenos, não poucas vezes inferiores a 1/3 do seu montante não obstante na execução o credor esteja pleiteando receber a totalidade do saldo devedor.
Ora, se ao tempo da venda do crédito o banco tivesse feito saber ao devedor de que venderia a dívida por 1/3 do seu saldo devedor, para livrar-se de um endividamento perigoso o produtor rural se interessaria em pagar aquele montante para preservar seu patrimônio.
Com efeito, se o credor iria vender seu crédito por “x”, embora valesse 3 “x”, não lhe interessava saber se o comprador seria “a”, “b” ou “c”, pois para ele o que importa é receber o valor e não a pessoa com quem está negociando.
Assim, se o mutuário rural não teve oportunidade de pagar a dívida pelos números que esta foi vendida, e tinha interesse de fazê-lo naquele tempo e valor, quando o novo credor se apresentar na execução para cobrar o débito em sua totalidade, cabe-lhe o direito de pleitear em juízo a quitação do saldo devedor pelo valor da cessão, invocando aí os princípios legais que disciplinam esta modalidade de financiamento.
Lutero de Paiva Pereira – Advogado especializado em direito do agronegócio. Fundador da banca na Lutero Pereira & Bornelli – advogados. Contato: (44) 99158-2437 (whatsapp) / pb@pbadv.com.br / www.pbadv.com.br
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