Quando se fala em CPR, muitos produtores rurais já ouviram que esse título não segue as regras do crédito rural. Esse, inclusive, é o entendimento predominante hoje nos tribunais: a CPR é um título sujeito apenas às regras próprias da lei que a instituiu.
CPR Financeira emitida com recursos do crédito rural
Mas essa leitura, repetida há anos, não dá conta da realidade atual. Isso porque, hoje, muitas CPRs emitidas por bancos e cooperativas de crédito na sua modalidade financeira — chamada CPR-F, ou CPR Financeira — possuem como lastro os recursos captados via Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), e aqui reside o ponto importante: a captação de recursos via LCA para lastro de emissão de CPR-F integra oficialmente o Sistema Nacional de Crédito Rural.
O próprio Governo Federal reconhece esse papel. Na divulgação do último Plano Safra, por exemplo a CPR aparece expressamente como instrumento para ampliar a disponibilidade de recursos ao agronegócio. Veja o que o Governo escreveu:
“Para impulsionar o setor agropecuário brasileiro, o Governo Federal lança o Plano Safra 2024/2025, no âmbito do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), oferecendo linhas de crédito, incentivos e políticas agrícolas para médios e grandes produtores. Neste ano safra, são R$ 400,59 bilhões destinados para financiamentos, um aumento de 10% em relação à safra anterior. Ainda, os produtores rurais podem contar com mais R$ 108 bilhões em recursos de Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), para emissões de Cédulas do Produto Rural (CPR), que serão complementares aos incentivos do novo Plano Safra. No total, são R$ 508,59 bilhões para o desenvolvimento do agro nacional.”
(Fonte: Governo Federal lança Plano Safra 24/25 com R$ 400,59 bilhões para a gricultura empresarial).
Em outras palavras: quando uma CPR-F é emitida por um banco e destinada ao custeio da atividade agropecuária, ela está, sim, inserida na engrenagem do crédito rural, uma vez que cumpre os requisitos do art. 2º da lei 4.829/65.
CPR Financeira é crédito rural
Se isso é verdade, as consequências jurídicas são claras. Essas CPRs não podem ser tratadas como um título autônomo qualquer, mas sim como operações de crédito rural em sentido material, sujeitas às balizas do Conselho Monetário Nacional (CMN). Isso significa aplicação de limites de juros e possibilidade de prorrogação da dívida em casos de frustração de safra, dificuldades de comercialização e outros fatores que inviabilizem momentaneamente o pagamento.
Trata-se de um novo enfoque, que ainda não foi enfrentada em profundidade pelo Judiciário, mas que pode trazer muita luz às questões jurídicas envolvendo CPR-Fs e endividamento rural. É uma construção que parte da coerência do sistema: se o Estado permite que os bancos usem CPR-F para cumprimento das exigibilidade de aplicação de recursos no crédito rural, não faz sentido negar ao produtor os direitos típicos dessa modalidade.
Essa ideia foi desenvolvida em artigo de minha autoria, publicado na obra “Direito agrário e ambiental – Do campo às cidades – debate sobre o futuro”, organizada pela UBAU, sob coordenação de Paulo Figueira e Rogério Devisate.
Produtor rural
Para o produtor rural, a mensagem é simples: se você tem dívidas com bancos formalizadas por CPR-F, saiba que pode existir um caminho jurídico para defender seus direitos. Essa nova leitura pode ser decisiva para equilibrar o jogo e evitar que o produtor carregue sozinho o peso de interpretações ultrapassadas que favorecem apenas as instituições financeiras.
Tobias Marini de Salles Luz – advogado, sócio-fundador da banca LCB Advogados. Contato:
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