Juridicamente, quanto ao penhor de safra em CCR, a figura do depositário fiel não tem espaço para enquadramento, a despeito de previsão legal em contrário.
O art. 17 do Dl 167/67 dispõe que os bens apenhados continuam na posse imediata do emitente da cédula ou do terceiro prestante da garantia real, os quais respondem por sua guarda e conservação na condição de fiéis depositários, seja o prestador da garantia pessoa física ou jurídica.
É importante destacar que, em se tratando de penhor rural, como é o caso, há impossibilidade fático-jurídica para enquadrar os prestadores da garantia como fiéis depositários da coisa, notadamente no caso de penhor de safra, justamente pela natureza do penhor rural.
Com efeito, a garantia pignoratícia se constitui ao tempo em que a cédula de crédito rural é firmada, conquanto nesse tempo a coisa dada em garantia sequer exista, posto que a lavoura ainda vai ser formada, para depois produzir os bens que se integram ao penhor cedularmente avençado.
Deste modo, a coisa, em termos de quantidade e de qualidade, não faz parte do mundo dos fatos quando se aperfeiçoa a garantia, de modo que se torna juridicamente insustentável afirmar, ou se constituir, o depósito dos bens nas mãos dos empenhador, seja ele o emitente da cédula ou o terceiro garantidor, posto não ser juridicamente possível ser depositário de coisa inexistente.
Deste modo, como ninguém pode ser depositário de coisa que não pode ser auferível em termos quantitativos e qualificativos, menos ainda guardador com as consequências de depósito fiel, não é possível asseverar que a figura do depositário fiel possa estar presente no contexto do penhor de safra em cédula de crédito rural.
Portanto, a despeito do art. 17 do Dl 167/67 assegurar que o empenhador assume a responsabilidade de depositário fiel da safra dada em garantia, no âmbito do direito penal, por exemplo, não é possível configurar a infidelidade jurídica, caso a coisa não seja localizada.
É preciso destacar que, na cédula de crédito rural, o penhor de safra é feito sob estimativa em termos de quantidade de produto, pois não se tem ao certo o quanto vai ser produzido, o que torna o depósito impreciso e, então, impossível. Também inexiste na cédula indicativos da qualidade do produto, o que contribui ainda mais para a total desconfiguração do depósito.
Assim, juridicamente, em termos de penhor de safra em cédula de crédito rural, a figura do depositário fiel não tem espaço para enquadramento, a despeito de previsão legal em sentido contrário.
Lutero de Paiva Pereira – Advogado especializado em direito do agronegócio em Maringá (PR). Contato: www.pbadv.com.br / pb@pbadv.com.br
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