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Contrato de Arrendamento Rural – o que você precisa saber

Qual é o conteúdo deste artigo?

Arrendamento rural é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga a ceder a outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de imóvel rural, mediante pagamento de um preço. É o contrato que garante o uso da propriedade rural para aquele que deseja explorá-la, comprometendo-se o proprietário a não intervir e, mais ainda, garantir àquele o uso pelo tempo contratado.

Legalmente, o contrato de arrendamento rural não precisa seguir uma forma específica, pois a lei dá liberdade para as partes. Também por isso, admite-se até mesmo a forma verbal, conforme definido pelo art. 92 da Lei 4.504/64 – Estatuto da Terra, muito embora essa não seja, na prática, uma forma recomendada.

Embora seja um contrato mediante o qual se transfere a posse direta ao arrendatário, é certo que se trata de uma relação meramente obrigacional, sem imposição de ônus real ao imóvel e, assim, não incide o art. 1.647 do Código Civil, ou seja, pode ser celebrado por um dos cônjuges proprietários sem a necessidade de outorga uxória (consentimento do cônjuge), mesmo que seja celebrado por prazo maior do que 10 anos (REsp 1764873/PR).

Qual a diferença entre arrendamento rural e parceria rural?

A exploração agropecuária também pode ser realizada através de contrato de parceria, mas não devemos confundir a parceria com o arrendamento, pois são instrumentos muito diferentes, tanto em sua essência, quanto em suas consequências.

Na parceria, diferentemente do arrendamento, não há preço certo a ser pago ao proprietário da terra, mas sim participação nos frutos obtidos com a exploração, inclusive com quotas pré-estabelecidas pelo Estatuto da Terra (art. 96, VI).

Assim, a essência da parceria é a partilha dos ganhos, mas, muito mais importante, também dos riscos, de forma que tanto o proprietário, quanto o parceiro, ficam sujeitos aos riscos do empreendimento, como o caso fortuito e a força maior. Já no arrendamento, o preço deve ser pago independentemente de frustração no empreendimento, pois não há partilha de riscos.

Outra diferença muito marcante é que, enquanto no arrendamento rural o arrendatário tem direito de preferência em caso de alienação do imóvel (art. 92, § 3º do Estatuto da Terra), o mesmo já não ocorre com a parceria, posto que não houve tal previsão legal (RESP 264805-MG).

Em busca de uma menor tributação, muitos produtores adotam uma prática controversa, uma espécie de contrato de parceria “Frankenstein”, o qual dizem ser de parceria, mas se comporta como arrendamento, prevendo cláusulas como o pagamento de preço pré-definido e a exclusão dos riscos do negócio.

Existe um prazo mínimo para o arrendamento rural?

Outra característica marcante do arrendamento é a duração mínima exigida para o contrato. Segundo estabelecido no art. 13, II, “a” do Decreto 69.566/66, que regulamentou o Estatuto da Terra, o menor prazo permitido é de 03 anos.

O Superior Tribunal de Justiça tem decidido que esses prazos mínimos são “norma cogente” e, portanto, de observância obrigatória, não sendo permitido às partes estabelecer prazo inferior a 3 anos (REsp 1.455.709/SP).

Quanto a isso, entendemos que, por coerência, se o Estatuto da Terra não se aplica aos médios e grandes produtores rurais, mas apenas aos pequenos, então aqueles (médios e grandes) estariam livres para contratar arrendamentos rurais por prazos inferiores a 3 anos. Este é o posicionamento atual do STJ.

É possível o pagamento do arrendamento em produto?

A lei em vigor, hoje, não permite que o pagamento do arrendamento seja fixado em quantidade certa de produto. O art. 18, parágrafo único do Decreto 59.566/66 é claro ao estabelecer que o preço do arrendamento só pode ser ajustado em quantia fixa de dinheiro, não de produto.

Então, o PREÇO do arrendamento deve ser estabelecido em dinheiro, moeda corrente, mas o PAGAMENTO pode ser realizado em produto, em quantidade de frutos, ao preço corrente no mercado local.

A prática comercial de nossos dias, contudo, é fixar o preço do arrendamento em quantidade de produto, e o pagamento em produto ou em equivalente monetário, ou seja, o oposto.

Embora tal prática seja vedada expressamente pela norma, é fato que isto ocorre na prática e, por vezes, pode trazer sérios problemas, por exemplo, se o proprietário precisar executar o contrato para receber o pagamento do arrendamento. Nestes casos, a justiça entende que o título não é suficiente para sustentar o processo de execução (AgIn no AREsp 1000062/TO).

Entretanto, o Direito é espelho do fato social, mas há, sempre um descompasso entre a prática e o nascimento da normatização. Considerando que é prática corrente e desejo de ambas as partes (proprietário e arrendatário) que o pagamento do arrendamento seja feito em produto, é certo afirmar que, em alguns anos, a cláusula que fixa o preço em produto pode vir a ser considerada válida.

Por conta dessas peculiaridades, é muito importante que o contrato seja redigido e orientado por um advogado especialista na área, que fará um documento coerente e lógico.

O que é o direito de preferência do arrendatário?

Como destacamos acima, uma das grandes diferenças entre o arrendamento e a parceria rural é que, no arrendamento, o arrendatário tem direito de preferência em caso de alienação do imóvel.

O Estatuto da Terra, em seu art. 92, garante o direito de preferência do arrendatário no caso de alienação do imóvel arrendado, determinando a sua notificação ou, caso não seja notificado, possibilitando a sua adjudicação compulsória, mediante o depósito judicial do preço.

Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o preço a ser depositado pelo arrendatário é aquele consignado na escritura pública de compra e venda registrada em cartório. Do registro da escritura também se inicia o prazo para o exercício do direito de preferência, nos termos do § 4°, art. 92 do mencionado Estatuto, o qual passa a contar da transcrição do ato de alienação no Registro de Imóveis.

Isto significa que o direito de preferência deverá ser exercido no prazo de 30 dias a contar da notificação que lhe comunica a intenção de venda ou, caso não seja notificado, no prazo de até 6 meses, contados da data do registro da alienação do imóvel (art. 92, §4º, Estatuto da Terra). E o valor, neste caso, será o valor disposto na escritura.

Além disso, se a venda ocorreu durante o prazo do arrendamento, mesmo que venha a ser registrada após a desocupação do imóvel pelo fim do prazo do arrendamento, o ex arrendatário poderá pleitear o exercício do direito de preferência, dado que o prazo se inicia com a transcrição do ato de alienação no Registro de Imóveis.

Além do direito de preferência de compra, o arrendatário também possui preferência para renovar o contrato de arrendamento em igualdade de condições com estranhos, ou seja, com terceiros que queiram arrendar o imóvel. Essa questão é muito importante e deve ser observada com cuidado entre as partes.

Segundo o Estatuto da Terra, em caso de renovação, o proprietário deverá notificar extrajudicialmente o arrendatário sobre as propostas existentes, no prazo de até 6 (seis) meses antes do vencimento do contrato, para que este possa exercer sua preferência. E não só isso: não se verificando a notificação extrajudicial, o contrato considera-se automaticamente renovado.

O Estatuto da terra se aplica à todos contratos?

Por fim, um ponto sensível e controvertido é se o Estatuto da Terra (Lei 4.504/64) se aplica a todos os contratos de arrendamento e parceria rural ou não.

Num primeiro olhar, e considerando que não há expressa limitação no próprio Estatuto, poder-se-ia afirmar que sim, que o Estatuto da Terra se aplica a todos os contratos de arrendamento e parceria. Mas será mesmo assim?

Como já dissemos, o fato social precede a norma, mas também sabemos que os Tribunais interpretam as leis. Deste modo, o trabalho jurídico é uma eterna luta para harmonizar o fato social com a norma e a sua interpretação.

E a interpretação que está se formando nos Tribunais Superiores é a de que o Estatuto da Terra se aplica exclusivamente a quem explore a terra pessoal e diretamente, como típico homem do campo (REsp 1447082/TO).

A prevalecer este entendimento, estariam excluídas das normas protetivas do Estatuto da Terra as empresas agrícolas que explorem terras de terceiros como arrendadores ou parceiros, perdendo, inclusive, o direito de preferência legal (ressalvado a preferência contratual, acaso existente).

Ao assim interpretar a norma, o Superior Tribunal de Justiça leva em conta que a grande empresa rural e o grande empresário rural não necessitariam das normas protetivas do Estatuto da Terra e que, para essas situações, prevaleceria o princípio da autonomia privada, ou seja, o velho princípio do pacta sunt servanda.

Se este for o entendimento a prevalecer, então também os Tribunais deverão, por coerência, aceitar que as partes, nestes casos, estarão livres para pactuar, por exemplo, que o arrendamento poderá ser pago em quantidade fixa de produto, dentre outras condições.

Existe um modelo de contrato?

Por fim, existe um modelo certo de contrato de arrendamento, um “copia e cola” capaz de prever todas as questões jurídicas e dar a segurança necessárias às partes?

Nem é preciso dizer que dar o imóvel em arrendamento é uma relação jurídica séria e complicada, ainda mais complexa quando o contrato utilizado para este fim não é redigido por um profissional do Direito que entenda os caminhos da legislação. A realidade tem demonstrado que esta economia geralmente gera gastos ainda maiores mais tarde, pois, apenas quando o proprietário precisar do contrato para proteger seu direito, descobrirá que suas cláusulas estão longe de proteger seu patrimônio.

Se você é proprietário rural e está com pressa para arrendar seu imóvel, aceitando um contrato feito às pressas e de qualquer forma, então a internet é o melhor lugar para garimpar estes modelos. Porém, se você, ao invés de arrendar com pressa, quer arrendar com segurança jurídica e evitar maiores dores de cabeça no futuro, fuja dos modelos de internet e procure um bom advogado para redigir seu contrato.

Até porque, como visto acima, com as recentes interpretações dos Tribunais e utilizando-se das modernas práticas legislativas, novas e exclusivas cláusulas podem constar dos contratos de arrendamento para dar melhor proteção ao patrimônio de quem arrenda, bem como assegurar o direito do arrendatário.

Pense nisto: para preservar e até mesmo aumentar seu patrimônio, cuide muito bem de suas relações jurídicas.

Wagner Pereira Bornelli – Advogado especializado em direito do agronegócio e empresarial em Maringá (PR). Contato: www.pbadv.com.br / wagner@pbadv.com.br

Tobias Marini de Salles Luz – advogado (OAB/PR 43.834) na Lutero Pereira & Bornelli – advogados associados. Contato: (44) 9 9158-2437 (whatsapp)tobias@direitorural.com.brwww.pbadv.com.br

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